Por Maria de Lourdes Lima da Fonseca Fabre, autora de A Oncinha Pintada: Histórias que Fazem Crer-Ser
A história A oncinha pintada é um convite ao olhar para a criança sob a ótica das necessidades emocionais básicas, dos esquemas desadaptativos e do adulto saudável. A ferinha se via mergulhada numa onda de pensamentos limitantes que a deixava triste, angustiada, com baixa autoestima e predisposta a comportamentos desadaptativos. Ela se via incapaz de realizar as tarefas que lhe eram propostas, o que afetava fortemente as suas emoções e a sua autoimagem. Na medida em que foi percebida, ouvida, acolhida e, sobretudo, orientada por alguém que lhe inspirou confiança e ofereceu seu amor, nesse caso, a fada, e depois, o professor Coruja, ela se experimenta, se percebe capaz, desenvolve outras habilidades e recupera o seu senso de pertencimento, de identidade e de competência.
A criança, em sua etapa de desenvolvimento, ainda não tem um conceito formado sobre si. Ele vai se formando a partir do que ela ouve a seu respeito no ambiente em que vive, a partir da interpretação que faz das experiências negativas ou positivas pelas quais passa, dentre outros fatores, e isso nos diz muito das suas necessidades emocionais.
As necessidades emocionais, comuns a todo ser humano, como segurança, proteção, afeto, empatia, expressão das emoções, autonomia, espontaneidade e lazer, limites, senso de identidade, senso de competência, precisam ser atendidas, pelo menos de forma suficiente na infância, levando em consideração cada etapa do desenvolvimento e o temperamento inato da criança. Quando isso não acontece, o cérebro infantil percebe o fato como uma ameaça de vida e dispara mecanismos de sobrevivência, o que, aliado a outros fatores, vão dar origem aos chamados esquemas.
Os esquemas, conforme Jeffrey Young, são “padrões emocionais e cognitivos auto derrotistas, iniciados em nosso desenvolvimento desde cedo e repetidos ao longo da vida”. São, na verdade, “armadilhas” que aprisionam e levam a pessoa a viver comportamentos e sentimentos pouco adequados à sua realidade atual. Eles são gerados e alimentados a partir da combinação de fatores como necessidades emocionais não atendidas, ambiente familiar, temperamento, fatores culturais, experiências de vida da pessoa. Pesquisadores identificaram, dentre outros, esquemas comuns, os de privação emocional, abandono, desconfiança, defectividade, isolamento social, incompetência, vulnerabilidade ao dano, emaranhamento, fracasso, arrogo, autocontrole e autodisciplina insuficientes, autossacrifício, subjugação, busca de aprovação, negatividade, inibição emocional, padrões, inflexíveis, postura punitiva. Esses padrões disfuncionais são ativados automática e inconscientemente por eventos significativos relacionados com as memórias das experiências vividas no passado, envolvendo uma carga emocional bastante elevada.
Quando a criança encontra um apego seguro, que supre as suas necessidades de afeto, de validação, dentre outros aspectos, ela se sente segura para explorar o ambiente, pois sabe que tem uma figura de apego para acolhê-la quando se sente ameaçada. Por exemplo, uma criança precisa ser estimulada a expressar sua dor, aprender a nomear seus sentimentos, e isso só acontece num ambiente seguro, sem julgamento, que leva em conta suas expressões. A partir de então, o adulto poderá ajudá-la a regular as emoções, já que seu cérebro ainda está em formação. Ela poderá descobrir formas adaptativas de lidar com aquilo que a incomoda.
Estar atentos às características individuais, ao atendimento das necessidades emocionais da criança, em cada etapa da sua vida, é o que se espera daqueles que são os cuidadores diretos da criança, como seus pais e demais pessoas responsáveis por ela. Esta é a base para a formação de adultos saudáveis, capazes de conviver de maneira adaptativa consigo, com os demais, numa ambiência que favorece o pleno desenvolvimento das suas capacidades.
Maria de Lourdes Lima da Fonseca Fabre
Poeta, escritora, graduada em Ciências Sociais pela UNIMONTES e em Psicologia, pela Faculdade de Saúde Ibituruna – FASE, pós-graduada em Educação Ambiental, pela Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG. Atua com a abordagem psicológica Terapia do Esquema e faz parte da comunidade de psicoterapeutas, “Segmente-se”. Atuou como coordenadora de uma creche em Janaúba, na EMATER-MG e na Companhia Energética de Minas Gerais – CEMIG. Depois de lançar dois livros de poesia, lança agora o primeiro livro infantil, que faz parte da série: Histórias que fazem crer-ser, com histórias para públicos diversificados.