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Por Zac (Tzvika) Rosenblum, autor de Sangar, Filho de Anate: A História do Terceiro Juiz dos Israelitas (Final do Século 13 a.C.)

 

Vocês sabiam que a Bíblia Hebraica tem apenas uma versão? Ou seja, a versão hebraica nunca sofreu alterações ou atualizações, e nunca sofrerá! E tudo isso por quê?

A Bíblia Hebraica é escrita de forma muito concisa, desprovida de descrições aprofundadas de lugares, pessoas, eventos e, sobretudo, sentimentos. Muitas vezes, os leitores terão a sensação de que o escritor bíblico errou ao omitir detalhes importantes, que poderiam ter iluminado as coisas, deixando-as mais claras. Esse estilo de escrita pode tornar a leitura da Bíblia menos agradável para muitos, porém devemos entender que a Bíblia diz precisamente o que deve ser dito, nada menos e nada mais! Esta é a razão pela qual o povo judeu nunca mudou uma única letra da Bíblia e nunca ousará mudar!

A maneira como um judeu lê a Bíblia é diferente. Os judeus veem a Bíblia como uma fonte inesgotável de mistérios e segredos que estão apenas esperando para serem revelados à pessoa que irá cavar mais fundo para investigar. Aos olhos do judeu, a Bíblia destina-se a encorajar pensamento profundo, aprendizado e discussão. Nesse sentido, sua leitura assemelha-se ao trabalho de um arqueólogo diligente, consciente de que para saber mais é preciso cavar e descobrir o que se esconde sob a superfície.

A história sucinta e misteriosa de Sangar, Filho de Anate, imediatamente chamou minha atenção. Sangar foi o terceiro juiz no período dos juízes, após Eúde Ben-Gera. Muito mistério envolve seu personagem, já que seu tempo é resumido em apenas um versículo do livro de Juízes:

“Depois dele foi Sangar, filho de Anate, que feriu a seiscentos homens dos filisteus com uma aguilhada de bois; e também ele salvou Israel.”
( Juízes 3:31)

  A época difícil em que Sangar atuou, que foi um período sombrio de medo e insegurança, é descrita em um outro (segundo) versículo, da poesia de Débora, a profetisa, que foi a juíza que serviu depois de Sangar:

“Nos dias de Sangar, filho de Anate, nos dias de Jael, cessaram os caminhos; e os que andavam por veredas iam por caminhos torcidos.”
( Juízes 5:6)

  No primeiro olhar, parece que a informação que temos sobre Sangar e sua obra é ínfima. No entanto, se tentarmos aprofundar os dois únicos versículos em que ele é mencionado, em combinação com a leitura “nas entrelinhas”, uma riqueza de detalhes e pontos para investigação e discussão é revelada! Vamos conferir:

  A. Um homem chamado Sangar, filho de Anate, realmente existiu e foi considerado o líder de uma tribo ou até mais, no final do ministério de Eúde Ben-Gera ou durante seu último ano. Sangar foi mencionado por duas entidades diferentes – o escritor bíblico e Débora (o escritor bíblico cita a poesia de Débora) – e isto apoia fortemente essa afirmação.

  B. O período de Sangar, filho de Anate, foi caracterizado por segurança pessoal muito instável, para dizer o mínimo. Na sua poesia, a Débora disse que as pessoas que queriam se deslocar, fizeram isso por estradas sinuosas e longe de estradas principais. Disso podemos entender que aqueles que se deslocavam pelas vias principais foram expostos a ataques de ladrões ou de pessoas de outros povos que não tinham relações pacíficas com as tribos israelitas. É evidente que esta foi uma época em que tanto a vida humana quanto a propriedade poderiam ser tomadas por outros a qualquer momento!

  C. Sangar, filho de Anate, foi um nome incomum em todos os aspectos, considerando o que foi habitual naquele tempo. Primeiro, o nome “Sangar” não é um nome hebraico! Muitos estudiosos tentaram interpretar seu significado. Uma das opiniões mais populares é que Sangar foi um estrangeiro que veio morar em uma das tribos israelitas e pode ter se convertido em algum momento do tempo.

Um outro ponto ainda mais curioso é a denominação “Filho de Anate”. Naquela época, era comum chamar os meninos pelo nome do pai, por respeito tanto ao pai quanto ao filho. Além disso, não foi uma época em que havia igualdade entre os sexos – as mulheres eram consideradas inferiores aos homens. Então, como é possível que um grande guerreiro tenha o nome de sua mãe? Aqui, os estudiosos estão bastante divididos em suas opiniões. Alguns afirmam que o nome “Anate” refere-se à deusa cananeia da guerra e da caça e, portanto, grandes guerreiros cananeus receberam o apelido honorífico de “Filho de Anate”; Outra opinião afirma que Sangar veio do assentamento “Beit Anat” que foi uma cidade cananeia na posse da tribo de Naftali e, portanto, ele foi chamado de “Filho de Anate”, ou seja, filho daquela localidade; Uma terceira opinião afirma que não se sabe quem foi o pai de Sangar, então ele recebeu apenas o nome de sua mãe.

Qualquer que seja a verdade, a afirmação de que Sangar não foi originalmente hebreu é certamente verdadeira, porque naquela época nenhum hebreu sensato teria pensado em usar um nome tão problemático quanto “Anate”.

  D. O escritor bíblico optou por mencionar Sangar e sua obra em apenas dois versículos e imediatamente passar para o próximo juiz. Porém, enfrentar centenas de guerreiros treinados, habilidosos e bem armados, quando Sangar tem apenas uma ferramenta agrícola à sua disposição – a aguilhada de boi – não é algo trivial. Por outro lado, o escritor bíblico teve o cuidado de apontar que essa conquista bélica foi alcançada sem armamento adequado. Será que ele queria elogiar Sangar, ou só queria mencionar que já naquele período os filisteus proibiam as tribos escravizadas de Israel a fabricar armas de ferro? São vários pontos para investigar e discutir!

Pessoalmente, sinto que o escritor bíblico descreve a obra de Sangar de forma casual e sem vontade, só para criar um registro cronológico que seja o mais confiável possível. Será que nos bastidores houvesse fatores que tivessem interesse em minimizar a contribuição histórica de Sangar e sua grande capacidade de luta? Ou talvez essa menção minimalista indique a rejeição que o escritor bíblico sentiu em relação ao juiz de origem cananeia? Talvez nunca saberemos as respostas certas para essas perguntas pungentes, mas estou me consolando com o fato de que essa descrição enxuta reforça a opinião de que o pouco que foi escrito é de fato a verdade, sem tentar embelezar a realidade.

  E. Sabemos que o ministério de Sangar foi curto em tempo e que a segurança pessoal do povo durante seu tempo continuou sendo abalada, embora esteja escrito que Sangar salvou Israel. Ou seja, parece que a salvação foi apenas parcial. Alguns afirmam que o ministério de Sangar durou apenas um ano, e no final ele morreu. Aos meus olhos, as peças do misterioso quebra-cabeça se recusam a se encaixar, pois ele foi um guerreiro extraordinário, no auge de seu poder, e não está escrito em lugar algum que ele achou sua morte em batalha.

Para gerar mais curiosidade ainda, vou contar sobre uma correspondência que descreve um grande guerreiro chamado Sangar, filho de Anate, que foi encontrada perto do Egito, ou seja, muito longe do território de Israel. Um vasto deserto separava o Egito de Israel naquela época, que foi habitado por diferentes povos, alguns deles provavelmente cananeus. Bem misterioso, não é ?

Espero que vocês já perceberam o quanto dá para investigar, discutir e aprender sobre Sangar e sua época, mesmo tendo apenas dois versículos falando a respeito. Embora aqui surgiram muitas questões (há muitas outras, com certeza) e certamente o oculto é maior que o visível, o fato de termos informações importantes sobre a vida e obra de Sangar, filho de Anate, não pode ser ignorado. Eu diria que temos alguns dos pilares da história, e tudo o que resta é tentar conectá-los usando o bom senso e a imaginação. Isto foi exatamente o que tentei fazer no livro “Sangar, Filho de anate”. É o momento para dizer também que meu objetivo principal foi fazer uma espécie de “correção histórica” e dar a Sangar – a quem apenas dois versículos na Bíblia hebraica foram dedicados – seu lugar de direito entre os outros que lideraram Israel ao longo de centenas e milhares de anos. Espero de todo o coração que eu tenha conseguido esta missão.

Ilustração – Sangar luta contra os filisteus com a aguilhada de boi (de ~1360 d.C.)

Fonte: ULB Darmstadt, via Wikimedia Commons

 

Zac (Tzvika) Rosenblum nasceu em Tel-Aviv, Israel, em 1974. Naturalizou-se brasileiro em 2020. Trabalhou durante 25 anos nas indústrias de alta tecnologia (High-Tech) de Israel e no Brasil, como desenvolvedor, gestor, diretor e empreendedor. Apesar de ser formado na área de Engenharia, sempre se encantou com as histórias da Bíblia hebraica (também chamada de Antigo Testamento), os grandes impérios da antiguidade e batalhas épicas. Gosta de viajar, jogar basquete, colecionar selos e, principalmente, contar histórias tanto para adultos como para crianças. Sangar, Filho de Anate é o seu primeiro livro.

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